Dia de Valentina
O mato crescia descontrolado e dificultava cada manobra da moto pela trilha. Ao chegarem, Valentina abraçou e beijou a tia, Lena sabia que aquele momento era muito esperado pela sobrinha.
— Agora você vai ficar aqui — disse a menina apertando o abraço.
— Sim, mas sinto lhe informar, minhas saídas vão aumentar.
Valentina olhava com um rostinho meigo para Lena, Rylan descobriu de onde ela aprendeu aquela habilidade.
— Não me olhe assim, é por uma boa causa. Vou estudar o que está acontecendo e quem sabe vou voltar o mundo a como ele era antes.
A sobrinha fungou, sinal de derrota em sua batalha em mantê-la no alojamento.
— Hoje a refeição é sopa de legumes — disse Valentina puxando o braço da tia.
Lena acompanhou a sobrinha até o refeitório, o ensopado era preparado em uma enorme panela para servir a todos. Por sorte, além de nutricionista, Ember também era ótima cozinheira. Ela não se queixava de preparar a refeição para seus colegas.
— Bom dia, Lena. Dormiu bem essa noite? — disse Ember.
— Bom dia, Ember. Sim.
Ember se aproximou dela e cochichou:
— E como foi?
— Como foi o quê?
— Não se faça de boba, todos aqui já estão sabendo.
— Sabendo o quê? — perguntou Valentina.
— Nada. A Ember está com umas ideias erradas, só isso — disse Lena.
— Ideia errada, eu? O pessoal o chama, dê o rapaz dos remédios.
Lena olhava para ela com as bochechas rubras, fazendo cara de paisagem. Valentina olhava sem entender.
— Já vou servir, diga ao rapaz dos remédios que ele será bem-vindo.
— O nome dele é Rylan.
— Prefiro chamá-lo de rapaz dos remédios.
O primeiro lugar que procurou Rylan foi no depósito de armas do Hector, e é claro, eles estavam conversando sobre armamento.
— Ember pediu para que eu te convidasse para o almoço — disse Lena ao encontrá-lo.
— Ember é uma pessoa?
— Sim, claro. Não temos androides aqui.
Eles foram para o refeitório, as mesas e cadeiras eram improvisadas, mas havia lugares para todos. Lena indicou como era o comportamento no local, cada um pegou um prato e entrou em uma fila. Ao chegarem próximo à panela, Ember olhava para ela e sorria com olhar malicioso.
— Essa é a Ember, nossa cozinheira e esse é Rylan — disse Lena, apresentando um ao outro.
— Prazer, o prato de hoje é sopa de legumes — disse a nutricionista, enquanto servia Lena.
— Gosto de sopa de legumes — disse Rylan.
Com os pratos cheios, sentaram em bancos improvisados. Enquanto comiam, ele observava os habitantes do alojamento.
— Tem mais pessoas aqui do que imaginei — disse Rylan.
— Às vezes vamos para a cidade, o normal é voltarmos com baixas, mas algumas vezes agregamos pessoas ao nosso alojamento. Já que tocou nesse assunto, posso copiar aquele mapa?
— Claro, será de grande ajuda para vocês.
— Por que você disse “vocês” e não “nós”? As pessoas daqui já consideram que você faz parte do alojamento.
— Eu não posso ficar aqui.
— Por que não?
— Tenho vários androides desativados, entre eles alguns estão contaminados. Além de outros equipamentos eletrônicos no galpão.
— Não deveria ter nada contaminado no galpão.
— Preciso deles. Também tenho medo, mas entendo que os estudar é a única possível solução para esse problema.
Parecia que Lena tomou um banho de água fria. Terminaram a refeição sem dizer mais nada.
— No dia em que nos encontramos, era uma expedição simples, pensávamos que nada poderia dar errado. Usávamos aquele shopping para coleta de víveres e nunca tivemos grandes problemas com ele, até aquele dia. Meu medo é que seus androides contaminados saiam do seu controle e o pior aconteça — disse Lena.
— Os pombinhos estão satisfeitos? — perguntou Ember ao ver que eles acabaram.
Ambos ficaram vermelhos, Rylan olhou para Lena com ternura. Ao terminar a refeição, Valentina deixou a turma das crianças e se aproximou da tia.
— Quero te… — dizia Lena.
— Não, você tem saído todos os dias, hoje é dia de ficar comigo.
O rostinho de brava de Valentina era fofíssimo, a reação dela convenceu a todos de que Lena deveria ficar.
— Dessa vez, ninguém vai concordar com você, voltarei ao amanhecer e trago uma cópia do mapa — disse Rylan levantando.
— Mapa? — perguntou Ember.
Lena os viu saindo enquanto conversavam a respeito do mapa, Valentina se apoderou do colo da tia. Por sorte, entre os sobreviventes havia professores. Eles davam um aspecto de normalidade para as crianças, a sobrinha falava sobre o que aprendeu na última aula.
Conversaram e brincaram até o cair da noite. Quando decidiram dormir, entraram em um quarto cheio de leitos. Aqueles eram para as mulheres maiores de idade, mas a sobrinha insistiu em dormir juntas.
Deitaram ao lado de uma cama vazia, Lena sabia que aquela era a da finada Emma, imagens do corpo aberto assombravam seus pensamentos. Engoliu seus sentimentos para não alarmar a menina.
Quando Valentina adormeceu, Ember se aproximou.
— Estava falando com o seu príncipe, ele me contou do mapa e disse de um mercado onde podemos encontrar recursos. Ficou combinado uma expedição para amanhã e Rylan pediu que te avisasse.
— Você vai à expedição?
— Não, não tenho mais idade para essas aventuras. Caso algo aconteça comigo, quem alimentará vocês?
Enquanto Ember se afastava, Lena olhou para Valentina, que dormia tranquila, e prometeu a si mesma: ‘Vou garantir que esse mundo seja mais seguro para ela, custe o que custar.’
Sumário
Androide zumbi
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