Célio Zangalli Neto

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Androide zumbi capítulo 21

Meia Taça de Vinho

A moto percorria caminhos desconhecidos para Lena. Durante o percurso, ela se lembrou de que passariam pelo mercado. Tão exausta, em seus pensamentos, temia outro confronto com androides.

Rylan estacionou na garagem de um edifício enorme, rodeado de letreiros com produtos e seus preços. Atenta, Lena sacou a arma e olhava para todos os lados quando desceu da moto.

— Pode guardar a arma, estamos em uma área pacífica — disse Rylan.

Lena olhou para ele e percebeu sua tranquilidade. Apesar do aviso, ele recarregava a doze.

— Se tem um mercado sem contaminação, por que não viemos aqui antes?

— Estamos muito longe do abrigo. Para virmos aqui com frequência, precisaríamos de muito combustível. O outro motivo é que havia três mercados como esse, mas dois deles foram infectados. Encontrei corpos mutilados neles.

— Me convenceu, mas não vou guardar a arma.

— Faça como quiser. Aquela promoção começou ao abrirem nessa manhã, isso significa que foi atualizado hoje. Estabelecimentos contaminados não editam suas placas — disse Rylan apontando para o maior de todos os outdoors.

Não havia motivos para desconfiar daquelas afirmações, Lena guardou sua arma no coldre e andava ao lado dele. Na entrada, Rylan puxou um carrinho como se fosse um dia comum.

— Eu não me lembro há quanto tempo estive em um mercado despreocupada — disse ela.

Os armários estavam desfalcados, Rylan coletava de tudo que encontrava.

— Como pensa em carregar todas essas coisas? — perguntou Lena.

— Colocarei em mochilas quando formos embora.

Lena andava pelo mercado, sorria e olhava os poucos produtos na prateleira. Um androide cortava peixes em um local frio, o medo fez com que ela se sentisse insegura. Rylan passou ao lado, empurrou o carrinho e foi ao encontro do androide.

— Com licença, gostaria de três quilos de lombo de bacalhau — disse Rylan.

— Perdão, o bacalhau está em falta, podem ser apenas dois quilos?

— Sim, por favor.

O androide cortou pedaços de lombo e entregou para Rylan. Lena olhava intrigada para eles.

— Faz tanto tempo que não interajo com androides, que sinto estranheza vendo você comprar peixe no mercado — disse Lena.

— Sei como se sente. No começo, também achava que todos os androides queriam me matar.

— Tem mais alguma coisa para pegar? Perguntando por que o carrinho está ficando cheio.

— Peguei tudo, só faltam as mochilas. Você gostaria de pegar mais alguma coisa?

Os olhos dela brilharam.

— Lembre-se de que teremos que levar na moto — disse Rylan.

— Eu sei.

Lena andava com leveza pelo mercado de armários quase vazios, Rylan se preocupava com a compra da sua parceira. Enfim, chegou a vinícola. Ela não encontrou o vinho que procurava, aquele que bebeu no restaurante no primeiro encontro entre eles.

Como bebia vinhos comuns, tinha dificuldade em escolher entre os caros. Sempre os desprezou por pensar serem artigos de luxo.

— De tudo nesse mercado, você decidiu pegar um vinho.

— Claro, algum problema?

— Não, nenhum. Fique à vontade para escolher — disse Rylan sorrindo.

A escolha foi uma das garrafas entre as mais caras, eles também levaram um saca-rolha. Saíram do mercado após pegar duas mochilas.

— Podíamos passar por aqui com mais frequência, o que você acha? — perguntou Lena.

— A cada quinze dias, combinado?

— Pensei a cada garrafa — disse Lena com olhar sorrateiro, mas logo percebeu que seu pedido não seria atendido. — Estou brincando.

Rylan sorriu, ele sabia que toda brincadeira guarda um fundo de verdade.

— Você sempre gostou de destilados?

— Sim, mas a correria do cotidiano não me permitia cultivar esse passatempo. Agora, tudo mudou, sinto que não estou deixando nada de lado quando bebo.

Levaram o carrinho com as compras até a moto. Quando chegaram, começaram a transferir os itens para as mochilas. Cada um estava com uma abarrotada, eles pensavam em como fariam aquela viagem.

— Me diz se consegue sentar no espaço que sobra da garupa — disse Rylan.

Após se posicionar, ele tentou ficar o mais à frente possível do banco. Lena pensou em questionar, mas lembrou do vinho. Como talvez aquela fosse a última chance de prová-lo, ela se esforçou para sentar na garupa.

— Estou pronta, mas vá devagar. Está difícil me segurar aqui.

Rylan deu partida, dirigia devagar, atendendo o pedido de Lena. Naquela velocidade, eles passariam horas sobre rodas.

Apesar da falta de espaço, Lena observava o caminho por onde passavam. O cheiro já não era tão aterrador quanto antes, alguns urubus sobrevoavam a cidade. Ela pensava que seu cérebro amenizava a situação para a vida continuar.

Em alguns momentos, Rylan foi obrigado a acelerar. Alguns androides corriam atrás deles, usar armas de fogo naquela situação estava fora de cogitação. Mesmo que mantivessem o equilíbrio, não seria seguro usar as mãos no manejo da arma.

Quando chegaram na mansão, o alívio veio com a felicidade de ainda estarem vivos. O pôr do sol coloria o céu, com tonalidades avermelhadas, ele parecia mais belo. Dores espalhadas pelo corpo por ficarem horas de mal jeito na moto, mas, pensando em tudo que pegaram, ambos achavam que valeu a pena.

Rylan abriu o portão, após fechá-lo, empurrou a moto até a mansão. Sentiu o alívio de tirar um fardo das costas.

— Hoje teremos peixe para o jantar — disse Rylan.

— Um prato diferente, você vai preparar?

— Sim, usarei meus dotes culinários.

— Ainda bem que um de nós tem conhecimento de culinária, se dependesse de mim seria enlatado todo dia.

Eles se olharam e sorriram, Lena ajudava a tirar as compras da mochila.

— Vou tomar um banho, estou horrorosa, veja só a situação do meu cabelo.

— Não diga isso, você só está suja, mas continua linda.

Lena olhou desconfiada para ele.

— Está bem, então vou para o banho para não ficar suja, melhorou?

— Sim — disse ele sorrindo.

Ela subiu as escadas e foi para o quarto, enquanto isso Rylan preparava o jantar. O banho foi reconfortante. Quando desceu, observou que seu companheiro deixou a garrafa de vinho junto ao saca-rolha na mesa. Os talheres, taças e pratos aguardavam o peixe.

Quando ele apareceu, Lena notou que também tomou banho. Enfim, estavam todos limpos para o jantar. O peixe com batata espalhava seu aroma pelo ar.

— Arrasou — disse ela aplaudindo-o.

— Obrigado. Depois que coloquei o peixe no forno, também decidi banhar.

Rylan sentou-se em sua típica cadeira de jantar.

— Precisa de ajuda para abrir o vinho? — disse ele.

— Sim, mas não é só por isso que eu não abri a garrafa.

— O que, além disso?

— Nós vamos ao quartel? O que espera encontrar lá? Vou dosar a bebida conforme o desafio de amanhã.

Rylan respirou fundo e comprimiu os lábios.

— Eu não sei o que encontraremos, imagino que seja um dos lugares mais protegidos da cidade. É possível que achemos algo relacionado ao androide, talvez alguns sobreviventes, é difícil saber quando tudo não passa de especulação.

O apito do forno sinalizou que a comida estava pronta.

— Vou pegar o peixe — disse Rylan.

Após colocar o prato na mesa, ele serviu meia taça. Pela explicação, o dia seguinte seria perigoso. Ela sabia que não deveria beber muito, mas não queria correr o risco sem provar aquele vinho.

O sabor do peixe estava esplêndido, era a melhor bebida que Lena já provara. Com muito esforço ela se segurou para não beber mais.

— Você acha que existem mais pessoas como a gente? — perguntou Lena.

— Acredito que sim. Não contei para não criar expectativa, mas se for possível, pegarei o banco de dados amanhã. Se houver mais alguns como nós, teremos acesso a eles.

Os olhos de Lena brilharam.

— Não crie expectativas antecipadas — disse Rylan.

— Eu sei, estou acostumada a frustrar minhas esperanças.

Depois do jantar, foram dormir. Lena lutou contra o desejo de levar a bebida para o seu quarto.

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